sexta-feira, 27 de abril de 2012

Não existe amor no ABC


Ele adentra ao shopping, observa que está abarrotado de gente, época onde o comércio atinge níveis absurdos, todo mundo parcelando o que não consegue pagar a vista, rezando para que no final do mês sobre alguma coisa e não aumentar ainda mais a divida crescente, os que tem a verba necessária não fazem nenhuma questão de acontecer isso, esbanjam gastando nos produtos eletrônicos de ultima geração e nas roupas das marcas mais famosas, isso o deixa com nojo e inveja ao mesmo tempo, nojo do consumismo exagerado, mas inveja de não poder gastar o suficiente para ele.

Mas esse não é o foco dele, se dirige a praça de alimentação, lá abre seu notebook como se fosse lá para trabalhar, mas não, é apenas mais um passatempo, aproveitando que está lotado e tem todo tipo de pessoas diferentes, ele começa a fazer um estudo das mesas ao seu redor e digitando tudo em um arquivo de texto.

A primeira vista observa um casal de jovens namorados, no máximo uns 20 anos, estão sentados com as cadeiras uma do lado da outra, não estão comendo, mas sim bebendo algo que lembra um Frapuccino, o homem como 90% das pessoas de sua idade estão usando uma camisa xadrez escura, calça jeans e um sapatenis, a mulher está quase idêntica, única coisa que a difere é uma bolsa enorme e uma melissa em seus pés, típico casal moderno. Parecem estar se divertindo e não fazem questão nenhuma de esconder isso, em alguns momentos chega a parecer que estão sabendo o que ele está fazendo, gostam da atenção. Ele cansou deles.

Volta sua atenção para um grupo de 5 adolescentes, provavelmente com uns 15 anos, coitados, sente profunda dó deles, estilo mais ridículo possível, tá mais do que óbvio que são de uma classe social alta, mas se vestem como marginais, como se fossem os verdadeiros malandrões, dois deles com o olho vermelho, o uso do baseado é evidente, se sentem os donos do Shopping, falam alto, riem alto, no momento que passa duas meninas com um peso elevado, não escondem o riso, praticamente na cara delas. O futuro da sociedade.

A atenção agora está centrada em uma família, um casal, um filho e uma filha. O filho está com aqueles vídeo-games portáteis em uma mão e uma batata do McDonald’s em outra, nota-se que é uma criança que desconhece a palavra exercício, provavelmente não sai da frente do computador ou do vídeo-game pra nada, com certeza deve ter ido ao shopping obrigado pelos pais. A menina, ao contrário do irmão, não deve saber o significado da palavra comida, está muito magra, a anorexia é evidente. Os pais nem parecem se importar com as crianças, na verdade parecem se importar nem com eles mesmos, não trocam uma palavra, apesar de terem escolhido o mesmo lugar para comer e terem uma cadeira só para guardarem as várias sacolas de compras, relação deve estar desgastada.

Se cansa um pouco do seu estudo social, resolve ir ao cinema, escolhe o blockbuster lançado mais recente, antes mesmo de entrar na sala percebe uma filha gigantesca para a compra de pipoca e refrigerante, não tem dinheiro para ficar gastando com besteiras. Acaba escolhendo um lugar bem ao fundo para conseguir ver direito, antes mesmo de começar o trailer se incomoda, barulho na sessão é exagerado, muitos adolescentes rindo e até mesmo gritando, torce para acabar quando começar a sessão. Coitado, qualquer cena de comédia já ouve as risadas mais forçadas possíveis. Em uma cena onde é feita uma revelação tão obvia que até uma criança de 5 anos entenderia, começam a comentar, bem alto por sinal. Isso para não falar do casal adolescente, que parecem estar se beijando como se não houvesse o amanhã, as vezes foi possível até ouvir alguns gemidos mais fortes. Fim de filme, uma merda, ouve aplausos, sente ânsia de vomito.

Sente uma vontade absurda de sair daquele local, vai pegar seu carro no estacionamento, bagunça enorme, fiscalização zero, ninguém para ajudar, buzinas o deixam com dor de cabeça.

Se pergunta o porque ainda faz isso, isso durante uns 5 minutos com o carro parado, encontra a resposta, ele é curioso por natureza e pior ainda, ele ainda tem esperança que algo mude no comportamento das pessoas.